sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Taís: no peito e na raça, na TV e no cinema

Taís Araújo tinha cerca de 8 anos quando ouviu de um coleguinha de classe a primeira manifestação de estranhamento em relação à cor de sua pele: “Quem paga a escola para você? Os patrões de seus pais?”, perguntou o garoto, provavelmente repetindo a dúvida de outros adultos. Hoje, aos 25 anos, e às vésperas de entrar no ar como Preta, a heroína da novela Da cor do pecado, da Rede Globo, a primeira protagonista negra de uma telenovela da emissora de maior audiência do país, Taís se lembra do episódio sem amargura, como uma das muitas curiosidades que marcaram a juventude passada no Méier. Filha de pedagoga e economista, a partir da terceira série passou a estudar em escolas particulares.
“Sempre fui a única criança negra da sala. Mas, para a minha sorte, a escola se preocupava em levantar a minha auto-estima. Eu era escolhida para funções de liderança, como participar do pelotão da bandeira e coisas do tipo”,
conta a ex-aluna do Metropolitano e do Anglo Americano, duas instituições freqüentadas pela fina flor da classe média carioca branca.



Taís diz que o preconceito nunca foi uma ameaça real, apenas um fantasma. Ainda assim, ela tem motivos de sobra para comemorar o papel na nova novela das 19h da Globo, que estréia dia 26 no lugar de Kubanacan. Ela, que já sentira o gostinho do estrelato na pele do personagem título de Xica da Silva, sucesso de audiência da finada Rede Manchete, vê sua atuação em A cor do pecado como um importante marco na participação do negro na indústria do audiovisual nacional. “Já estava mais do que na hora de sermos reconhecidos como parte significativa da cultura brasileira, de deixarmos de interpretar papéis secundários. Seria ridículo, nos dias de hoje, vermos um ator branco pintar o rosto para fazer um personagem negro, como aconteceu com Sérgio Cardoso, nos anos 60, na época da novela A cabana do pai Tomás. Mas só estou fazendo a Preta porque outros atores negros batalharam
por isso. Foi por causa da luta de gente como Zezé Motta, Milton Gonçalves e Grande Otelo que eu e outros atores negros da minha geração, como o Lázaro Ramos (O homem que copiava) e o Jonathan Haagensen (Cidade de Deus) estão podendo mostrar o rosto na TV e no cinema. Mas o Brasil é um país onde o preconceito racial ainda é muito velado”, diz a atriz.
Apesar de o racismo não
ser seu tema principal, a novela A cor do pecado vai abordar de forma indireta esse estigma que não ousa dizer sua cor. A personagem de Taís é uma maranhense de origem humilde, que trabalha vendendo ervas medicinais na feira de São Luis e que se apaixona por Paco (Reynaldo Gianecchini), um botânico carioca e herdeiro de grande fortuna, de passagem pela cidade. O problema é que Paco é noivo de Bárbara (Giovanna Antonelli), moça sem recursos financeiros mas extremamente ambiciosa, que fará de tudo para garantir o casamento milionário. “A Bárbara usará o racismo dissimulado do brasileiro para humilhar Preta de todas as formas possíveis. A minha personagem vai sofrer muito, mas sofrerá mais por amor do que por preconceito, porque ela é heroína romântica clássica: chora muito, mas batalha pelo que quer”, conta Taís, que aprendeu a dançar o tambor de crioula, dança típica do Maranhão, que remonta aos tempo dos escravos, para compor a sua personagem.
A novela também serviu para apagar de vez as más lembranças que a atriz tinha do estrelato na televisão, por causa de Xica da Silva. A novela da Manchete chegou a ser esticada por 265 capítulos em função da repercussão da trama, que explorava a nudez da atriz, no papel da ex-escrava do século 18.
Quando os primeiros capítulos da história foram ao ar, em 1996, Taís tinha apenas 17 anos. O Juizado de Menores proibiu a veiculação das primeiras cenas de nu da personagem antes que sua intérprete completasse a maioridade.
A emissora transmitiu a nudez de Xica da Silva na noite em que Taís completou 18 anos. “Lembro que várias revistas anteciparam as fotos dos nus da Xica. Tenho a impressão de que a emissora armou tudo aquilo, porque precisava da promoção”, conta a atriz, que em breve também poderá ser vista no filme Garrincha - Estrela solitária, de Milton Alencar.
O cinema não é uma atividade nova no currículo da jovem atriz, que fez um pequeno papel em Um sonho no caroço do abacate (1998), de Lucas Amberg.
Mas só recentemente ela passou a vivenciá-lo com mais intensidade e propriedade. No filme dirigido por Milton Alencar, Taís interpreta a cantora Elza Soares, por quem o craque se apaixonou e deixou a primeira mulher e filhas. O apoio de Elza, que mais sofreu com as pressões sociais, foi decisivo na vida do jogador, que morreu na pobreza. “Imagina! A Elza era pobre e negra e manteve um caso extra-conjugal. Claro que ela virou a grande vilã”, diz Taís Araújo


Fonte: caderno

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